Por algum tempo há várias teorias na internet sobre como a computação quântica pode ‘matar’ o bitcoin. Entre os diversos especialistas que têm falado sobre esse tema está Anastasia Marchenkova, uma engenheira de software com especialização em física quântica.
Em seus textos e vídeos, ela mostra que embora a computação quântica não represente risco para a mineração de bitcoin, é uma ameaça real aos algoritmos que mantêm o bitcoin – e a internet como um todo – seguros. A criptografia funciona aplicando uma fórmula matemática a uma mensagem, embaralhando-a de forma que apenas uma pessoa autorizada por você possa vê-la.
Com maior força computacional, mais rapidamente o blockchain destrava e emita mais uma moeda digital. O hash é calculado pela velocidade de operação de um dispositivo de mineração de criptoativos. Por isso, de tempos em tempos o sistema autorregulado do blockchain do bitcoin promove um “ajuste de dificuldade” nas equações, para certificar-se que o blockchain continuará transmitindo blocos a cada dez minutos.
Marchenkova lembra que o blockchain do bitcoin já possui um sistema integrado que o protege contra quem tenta usar algoritmos quânticos para extrair BTC em um ritmo rápido.
“Digamos que certo dia nós descobrimos um algoritmo quântico que conseguiria resolver isso mais rápido. Bitcoin é projetado para ajustar a dificuldade se extrairmos blocos muito rápido. Portanto, mesmo que encontrássemos esse algoritmo quântico, a dificuldade seria ainda maior”, resume.
Esse “algoritmo quântico” venceria a barreira imposta pelas complexas equações criptográficas da blockchain para a emissão de moedas digitais. Caso fosse derrubado, a produção seria tão fácil quanto apertar o botão de uma máquina de xerox para fazer cópias automaticamente. Uma moeda que pode ser gerada instantaneamente perde totalmente seu valor e, assim, pelo fim da escassez. Seria decretado o fim do bitcoin e todas as criptomoedas.
Claro, quem lida com softwares está ciente das vantagens e riscos da computação quântica, mas ela parece ser inevitável em algum momento do futuro.
No entanto, o físico alertou que a computação quântica representa um sério risco para os que mantêm as criptomoedas e a internet em geral seguras.
“Dois dos criptosistemas mais comuns são Rivest – Shamir – Adleman (RSA) e criptografia de curva elíptica (ECC). Quando você estiver online, qualquer informação trocada será criptografada, geralmente com RSA ou ECC. Ambos são vulneráveis a ataques de computadores quânticos. Um computador quântico grande o suficiente será um problema de segurança para qualquer pessoa online”, explica Marchenkova em seu blog.
Chave privada e o algoritmo de Shor
Nos computadores que usamos hoje, para realizar funções do dia a dia, seu processador transforma todos os dados em cadeias de 0 ou 1, usando o sistema binário, mais simples. Os bits, que são adotados neste sistema, fazem com que a máquina seja capaz de solucionar qualquer questão, desde a exibição de imagens na tela do monitor, até a simulação de cálculos. Nos computadores quânticos, essas operações passam por uma tecnologia chamada qubits, onde as informações podem assumir até dois valores distintos e simultaneamente. Então, se um bit pode obter dois valores diferentes ao mesmo tempo, o computador ganha tempo na hora de processar tarefas muito exigentes.
O sistema do bitcoin usa criptografia de curva elíptica para gerar a chave pública. Essa chave pública é criada a partir da chave privada, que autoriza as transações. “Isso significa que alguém com um computador quântico grande e coerente o suficiente, com coerência significando o período de tempo que as informações quânticas podem ser armazenadas, pode realmente obter sua chave privada de sua chave pública e isso é um problema muito sério”, assevera Marchenkova.
Então, sim, o futuro das criptomoedas pode estar ameaçado, com os avanços da tecnologia. A computação quântica já é testada em programas experimentais de grandes empresas de tecnologia, mas não há uma data prevista para que seja, de fato, usada em larga escala.
Conforme Marchenkova, a segurança de mensagem computacional depende da dificuldade de “desfazer” o problema matemático sem a chave. “Por exemplo, o RSA depende do difícil problema de fatorar números. Multiplicar dois números primos é fácil, mas pegar um grande número e fatorá-lo para obter esses dois números primos é difícil. Levaria mais tempo do que a idade do universo para fatorar uma chave de 4096 bits com um computador normal. No entanto, os computadores quânticos resolvem problemas de maneira diferente dos computadores que dispomos hoje”.
A solução seria encontrada na teoria da complexidade computacional, onde o algoritmo de Shor, batizado em homenagem ao matemático Peter Shor, é usado como modelo de algoritmo quântico, capaz de fatorar um número N não primo de L bits.
O cálculo quântico de Shor explora a mecânica quântica, usando bits quânticos, ou qubits reciclados, para simplificar a fatoração de números em um produto de números primos – uma tarefa muito complexa para os computadores comuns.
“O algoritmo de Shor pode encontrar os fatores primos de um número e pode “desfazer” esse problema de fatoração com muito mais facilidade do que um computador clássico. Isso significa que alguém com um computador quântico grande e coerente o suficiente poderia, em teoria, obter sua chave privada a partir da chave pública. Esse é um problema sério. Uma chave privada nunca deve ser compartilhada com ninguém, porque essa chave privada pode ser usada para autorizar transações que o proprietário não deseja que aconteçam. Portanto, à medida que os computadores quânticos se tornam melhores, a segurança do RSA não será mais eficaz”, resume.
A especialista não é tão pessimista e acredita que pode ser encontrada uma solução para que as criptomoedas não desapareçam. Marchenkova acredita que responsáveis pelos ativos digitais devem investir em soluções que possa resistir efetivamente a ‘ataques’ vindos de computadores quânticos. Isso seria possível com o desenvolvimento de um novo tipo algoritmos na criptografia.
“Precisamos de um algoritmo que realmente possa resistir a ataques quânticos. Chamamos isso de criptografia pós-quântica. São algoritmos clássicos não baseados em princípios quânticos que podem resistir a ataques de computação quântica. Um dos principais candidatos atuais é a criptografia baseada em rede”, finaliza.